O mercado de geração distribuída

Canal Energia - Regulação - 12/07/2017

Verifica-se, pois, que, embora o país viva uma séria crise política e econômica, o mercado da geração distribuída, paulatinamente, viabiliza-se, buscando a sua real posição na matriz energética brasileira

Artigo Osório de Brito, da COGEN

A Nota Técnica da ANEEL (NT 56/2017) expõe projeções relativas ao desenvolvimento da microgeração solar fotovoltaica no período 2017/2024 (8,86 milhões de unidades consumidoras, em 2024, gerando 785,4 GW); a Agencia já havia, em 2015, previsto uma geração localizada, junto às unidades consumidoras, para esse mesmo período, totalizando 4,6 GW (1,23 milhão de unidades consumidoras, em 2024, gerariam esses 4,6 GW). Contudo, não obstante tais números representarem um crescimento previsto significativo, omitem o desenvolvimento de outras formas de geração distribuída; obviamente, portanto, não representam a totalidade desse mercado, desse parque descentralizado.

Dentre as formas pelas quais se constitui a geração distribuída, a fotovoltaica foi aquela analisada, de per si, pela ANEEL; inegavelmente, ela vem demonstrando vertiginoso crescimento pois possui as condições necessárias e suficientes para sua utilização maciça em residências e em unidades comerciais; contudo, entre as instalações dessa natureza e desse porte, inclui-se a micro-cogeração qualificada, até 1 MW, hoje já presente em condomínios residenciais, em vários deles localizados no Recreio dos Bandeirantes, na cidade do Rio de Janeiro. Importa ressaltar que essas instalações condominiais, concomitantemente, aquecem as suas piscinas, iluminam as suas partes comuns e atendem seus motores de pequeno porte, além de permitir trocar energia com a distribuidora, a exemplo de qualquer instalação fotovoltaica.

Por sua vez, a regulamentação da ANEEL (Resolução 687/2015), ao igualar as unidades de até 5 MW aos benefícios já existentes para as valoradas em até 1 MW, vem permitindo que industrias e/ou consumidores, possuidores de unidades cogeradoras e com disponibilidade de geração de excedentes elétricos, os exporte e, ao exporta-los, evitem a geração desse porte no parque centralizado e, também, a sua circulação na malha de transmissão. Uma conexão dessa magnitude, enquadrada nos ditames da Resolução 687, por exemplo, já acontece na rede de distribuição da LIGHT, no Rio de Janeiro.

Ademais, as instalações cogeradoras de valores superiores a 5 MW vêm apresentando crescimentos significativos; são elas as que se utilizam da queima da biomassa da cana de açúcar e/ou de resíduos desta natureza; e as que queimam gás natural, sem contar com as já contempladas pela Resolução 687/2015, supracitadas. Com efeito, dados informados pela COGEN (Associação da Industria de Cogeração de Energia), englobando todas as instalações cogeradoras, não importando o combustível utilizado, os números confirmam essa assertiva, a saber:

  • Até 1980 – 2.944 MW de capacidade instalada
  • em 1990 – 3.321 MW;
  • em 2000 – 4.163 MW;
  • em 2010 – 9.268 MW; e
  • em 2017 (até abril) – 16.877 MW.

Observe-se que o crescimento ocorrido entre 2010 e até abril de 2017 valorou-se em, aproximadamente, 8 % aa, valor altamente expressivo; esse crescimento venceu todas as dificuldades ainda persistentes, dificuldades essas a impedir a viabilização adequada para toda e qualquer instalação cogeradora e, de uma maneira geral, para a ocorrência do uso eficiente da energia pelas unidades de consumo.

Verifica-se, pois, que, embora o país viva uma séria crise política e econômica, o mercado da geração distribuída, paulatinamente, viabiliza-se, buscando a sua real posição na matriz energética brasileira. Importa evidenciar que, ao evitar o uso da malha de transmissão e o acionamento de componentes do parque centralizado, aumenta, inexoravelmente, a produtividade setorial. Com efeito, esse parque descentralizado desonera a produção centralizada, ao não despachar termelétricas e/ou evitar que hidrelétricas sejam empregadas, permitindo, consequentemente, o enchimento de suas barragens; acresce-se, ademais, a melhora da qualidade da energia oferecida aos demais consumidores conectados ao alimentador ao qual se interliga o gerador distribuído.

Vale, por fim, registrar que esse contexto repercute, substancialmente, na forma de trabalhar das distribuidoras elétricas. Embora, hoje, pontualmente, as conexões, com suas redes, realizem-se sem maiores dificuldades, no momento em que a geração distribuída começar a se desenvolver rapidamente e necessitar interligar-se, evidenciar-se-á o seu despreparo para operar com esses entrantes em número elevado e dispersos localmente. Urge que se adaptem ao novo modelo: controlar a intermitência da energia fotovoltaica, fornecendo-lhe o “back up” correspondente, e a exportação dos excedentes elétricos provenientes da cogeração e da autoprodução de terceiros. Esse será o cenário futuro.

Osório de Brito é engenheiro e diretor regional Rio de Janeiro da COGEN(Associação da Indústria de Cogeração de Energia)