Cogeração aposta na GD de grande porte para crescer


Brasil Energia - 14/03/2020

 

Em entrevista, Leonardo Caio Filho, da Cogen, fala sobre planos da Aneel de regulamentar leilões de GD para distribuidoras e sobre biometanização dos resíduos

Depois da frustração no ano passado de não ter o pleito atendido, junto ao governo, para negociar no ACL o excedente da garantia física das usinas sucroenergéticas, o que agregaria segundo contas da Associação da Indústria de Cogeração de Energia (Cogen) cerca de 1 GW à geração e R$ 1 bilhão em receita por safra, o setor de cogeração de energia tem novas demandas para este ano.

Entre outras bandeiras, a principal delas é apoiar a formatação de chamadas públicas das distribuidoras para contratação de geração distribuída de grande porte (acima de 5 MW), o que está sendo planejado pela Aneel, explica em entrevista à Brasil Energia o diretor de tecnologia e regulação da Cogen, Leonardo Caio Filho. Leia os principais trechos da entrevista a seguir:

O setor já se conformou com a negativa do MME em rever a portaria 564 e permitir a negociação do excedente de garantia física no ACL?

Foi uma frustração para o setor e, embora ainda acreditemos que a alteração continue a ser benéfica e muito fácil de ser feita, com uma simples canetada na portaria, será difícil retomar o tema com o ministério. Mas agora queremos nos concentrar em outras demandas.

Quais seriam as novas demandas?

A principal é apoiar o interesse expresso da Aneel em estruturar o modelo de chamadas públicas para as distribuidoras contratarem até 10% da energia por meio da geração distribuída acima de 5 MW, o que é permitido desde o decreto 5163/2004 e viabilizado pela instituição, através da Portaria MME 65/2018, dos valores de referência específicos (VREs) das fontes, que é o valor limite para o qual a agência autoriza o repasse integral aos consumidores dos custos de aquisição de energia.

Em qual estágio está esse interesse da agência?

A Aneel nos informou que em cerca de um mês vai lançar consulta pública para definir a modelagem, saber quais fontes podem participar, tempo de contratação, prazo para instalação, entre outros detalhes. Seguindo um ritmo natural de tramitação, seria possível começar a ter essas chamadas no segundo semestre, que poderiam ser promovidos antes dos leilões convencionais do mercado regulado em áreas de interesse apontadas pelas distribuidoras.

Qual a expectativa para o setor com essas contratações?

Apenas para a cogeração de bagaço de cana, sem aumentar o canavial existente, daria para triplicar o que tem hoje de capacidade, passando dos atuais 11,5 GW para aproximadamente 30 GW. Isso sem falar que seria ótimo para o consumidor ter geração próxima do centro de carga, muito menos sujeita a interrupções e que no fim das contas se torna uma energia mais barata por conta disso.

Qual seria o perfil dessas usinas para geração distribuída?

De qualquer uma das fontes com os VREs, em ampliação ou plantas novas para cogeração a bagaço de cana, a gás, biogás, mas de forma específica para as opções de energia firme na base, não as intermitentes, em projetos de 30 MW ou 50 MW. Nesse ponto, para ficar claro, a Aneel pensa até em mudar o nome da opção de geração distribuída, muito vinculada às mini e microusinas, para por exemplo algo como leilão de recursos energéticos distribuídos.

Além dessa pauta, o setor tem outras causas para defender em 2020?

Sim, outro ponto que estamos avaliando as oportunidades e identificando gargalos regulatórios com as usinas é a biometanização dos resíduos, principalmente vinhaça e torta de filtro, cuja sobra é muito grande e pode ser aproveitada. Trata-se de grande oportunidade. A indústria gasta em média 2,5 bilhões de litros anuais de diesel na frota, que poderiam ser substituídos por biometano, gerando uma economia aproximada de R$ 6 bilhões por ano. A ideia é ver também as possibilidade de agregar mais energia elétrica através do biogás. Nesse sentido a breve entrada em operação da Usina Bonfim, da Raízen, em Guaíba (SP), vai servir de modelo para outros interessados aderirem ao negócio.

O setor está capitalizado para esses investimentos?

A dívida do setor ainda é algo que não foi equacionado, está na casa dos R$ 90 bilhões e com certeza isso pode ser um obstáculo para o capex dos projetos. Muitas usinas não têm dinheiro para investir e nem garantia para obter financiamento. Mas o que pode acontecer é a parceria. Há muitos investidores nacionais e estrangeiros interessados em entrar como sócios das usinas em projetos de biogás e biometano. Em uma situação normal de mercado, as usinas prefeririam entrar sozinhas no negócio, mas para não perder a janela do investimento essas parcerias têm grandes chances de começarem a ocorrer.

A nova política nacional de biocombustíveis, o Renovabio, também motiva o setor a ter melhor pegada de carbono e aderir à biometanização?

Com certeza, no sentido de que, ao aproveitar o resíduo para gerar energia elétrica ou biocombustível para a frota, aumenta-se a nota de eficiência energética das usinas certificadas para emitir os créditos de descarbonização (Cbios). Com a nota melhor, mais Cbios podem ser emitidos. A política serve como forte estímulo, mas há outros também importantes, como a regulamentação em consulta pública no estado de São Paulo, pela Arsesp, para o swap do gás natural e do biometano, que vai permitir que usinas no interior paulista injetem biometano na rede da GasBrasiliano e o comercializem na região metropolitana de São Paulo, onde a concessão dos gasodutos é da Comgás. Isso torna ainda interessante os investimentos na biometanização.